Podemos adjetivar o ESPIRITISMO?

Livros espiritas

Em um debate recente sobre a possibilidade de adjetivarmos o termo ESPIRITISMO, notamos a imensa dificuldade dos adeptos do doutrina espírita, que entendem que só existe um espiritismo (o de Kardec), de ao menos considerar a possibilidade. Para eles qualquer tipo de variação é um crime contra a pureza doutrinária da forma como ela foi estabelecida pelo mestre lionês.

Em fevereiro desse ano divulgamos um manifesto assinado por mais de 700 pessoas e instituições que defende a ideia de um ESPIRITISMO KARDECISTA LIVRE. Antes desse manifesto nos apresentamos como Espíritas Progressistas para nos contrapormos a posições conservadoras (tanto em relação aos costumes quanto a ideias políticas e econômicas). Nos dois casos, usamos adjetivos com a intenção de definir com mais clareza os fundamentos que norteiam nossa visão do espiritismo. O mais interessante é que o próprio Kardec usou adjetivos para apontar diferentes tipos de espiritismo.

Segue aqui o exemplo citado por Sergio Aleixo sobre o problema da adjetivação da palavra ESPIRITISMO:

Revista Espirita – DÉCIMO PRIMEIRO VOLUME – ANO DE 1868

Espiritismo Retrospectivo (página 342) – A MEDIUNIDADE NO COPO D’ÁGUA EM 1706 (em casa do duque de Orléans)

Pode-se compreender, sob o título geral de Espiritismo retrospectivo, os pensamentos, as doutrinas, as crenças e todos os fatos espíritas anteriores ao Espiritismo moderno, isto é, até 1850, época na qual começaram as observações e os estudos sobre essas espécies de fenômenos. Não foi senão em 1857 que tais observações foram coordenados em corpo de doutrina metódica e filosófica. Esta divisão nos parece útil à história do Espiritismo.

A esse raciocínio podemos acrescentar as diversas menções ao Espiritismo entre os druídas (especificamente na Revista Espírita de abril de 1858). Kardec olha para o passado e identifica aquilo como um espiritismo (mesmo que os druídas não nomeassem a suas práticas com essa palavra). Eram ESPIRITAS portanto pensamentos, doutrinas e crenças espiritas anteriores ao Espiritismo Moderno. Filologicamente não existe nenhuma restrição em se adjetivar a palavra espiritismo para esclarecer o sentido estrito que se quer dar a palavra (como Kardec fez com o adjetivo Moderno).

Outra informação importante é que a palavra ESPIRITISMO não foi criada por Kardec (apesar disso aparecer em algumas biografias). Ele adaptou para o francês a palavra que aparece primeiro em escritos de língua inglesa.

Algumas considerações derivadas desse raciocínio:

1 – O termo Espiritismo Kardecista obviamente não seria usado por Kardec já que esse termo só faz sentido pra o que veio depois dele. Portanto o fato dele não ter usado esse termo não é justificativa para não adotá-lo. 

2 – Também não é um repetição (pleonasmo) dizer que o Espiritismo é Kardecista. Por tudo o que aconteceu no século XX e XXI – separação entre espiritismo e umbanda, Pacto Áureo (FEB), Gasparetto, João de Deus, etc – o significado da palavra ESPIRITISMO foi ampliado, portanto, para se resgatar a essência do pensamento investigativo, analítico e crítico de Kardec, a adjetivação que vem com a palavra KARDECISTA é uma solução.

Para aqueles que argumentam que Gasparetto, João de Deus e Robson Pinheiro (entre outros), não são espíritas, é importante lembrar que a compreensão do significado de ESPIRITISMO não é exclusiva dos adeptos da doutrina. É só entrar em qualquer livraria/sebo (ou qualquer loja especializada) e olhar os livros que estão marcados como “Livros Espiritas”, por exemplo. A sociedade e a academia olham para todo esse movimento e enxergam um único pacote (ainda que dividido em fases, como é o caso do trabalho da pesquisadora Sandra Jacqueline Stoll sobre o Espiritismo à Brasileira).

3 – O termo ESPIRITISMO KARDECISTA é inclusivo já que não nega que outras propostas sejam compreendidas como ESPIRITISMO (que tem a reencarnação, a comunicação com os espíritos e a mediunidade como base essencial). O adjetivo determina a abordagem KARDECISTA nas atuações de seus adeptos. Ela nos permite deixar claro que temos pontos de contato e portanto de diálogo com outros “espiritismos”, mas que somos críticos e não legitimamos práticas que neguem a abordagem de Kardec diante do fenômeno.

4 – A ideia de que só existe um espiritismo tem ressonância com a hegemonia de um pensamento único  no movimento espírita. Nós que nos classificamos como progressistas somos críticos dessa hegemonia, não faz sentido defendermos o termo ESPIRITISMO como único e inflexível. 

Uma decorrência prática dessa adjetivação é que ela põe fim à necessidade de tratar determinados assuntos sem a devida clareza. Um exemplo é a adoção a obra Os Quatro Evangelhos de Roustaing, pela Federação Espírita Brasileira, como parte do corpo doutrinário do espiritismo. Não há compatibilidade entre a obra de Roustaing (que não passaria pelo método investigativo, analítico e crítico de Kardec) e a obra produzida pelo pedagogo francês. A FEB, nesse caso poderia assumir ao público que o espiritismo que ela defende é Roustanguista, adjetivação essa que deixaria claro para o seu público o que eles estão abraçando como doutrina, como valores, como visão de mundo.

Nós por aqui abraçamos e defendemos o termo KARDECISTA para deixar claro para o público quais os valores e qual a visão de mundo que nos norteia; que de um lado se baseia no método de Kardec para analisar o fenômeno mediúnico e suas decorrências, e de outro não entende os escritos de Kardec como revelação ou explicação para tudo (lembrando que essa postura não dogmática é recomendada por ele mesmo).

 


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5 respostas para Podemos adjetivar o ESPIRITISMO?

  1. JOÃO LUIZ GARRUCINO disse:

    Textos recentes analisando os cenários e a conjuntura do Brasil e do mundo sob óptica diferente ou fora das velhas caixas de crenças ou ideologias reacionárias e conservadoras, aprofundo uma visão crítica radical da atual crise ética, moral e espiritual do Brasil e da humanidade a caminho do nada ou do buraco, ruina, queda, destruição e morte se nada for feito ou se não mudarem a atual educação heterônoma para uma autônoma libertadora dos cidadãos com ciências, história, filosofia, física quântica, democracia e liberdade efetivas, e o Deus real da física quântica, e o Jesus real do cristianismo primitivo, desmoronando todos estes castelos medievais como enormes muros de Berlim em novas Perestroikas ou Glasnot agora globais detonando o reino ou ditadura das ideologias materialistas e fundamentalistas religiosas, políticas e econômicas da atual ditadura global gerando os males que vemos no mundo em plena nova era ou terceiro milênio ou século XXI.

    Extrema direita cresce em reação à esquerda e áreas acadêmicas presas no modelo materialista newtoniano ignorando física quântica e democracia.

    https://www.linkedin.com/pulse/extrema-direita-cresce-em-reação-à-esquerda-e-áreas-presas-garrucino/?fbclid=IwAR3Lzi-r8niJ63Y3EgiHWH-n23inpuEnymP-0gzP-wORVRsgxTWXvBDcnlE

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  2. Euler Neiva Fuques disse:

    “Deus me livre ser sábio: parece um cachorro correndo atrás da própria cola”. Defende, na minha ótica, o indefensável. Abraço.

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  3. Ciimael Campos disse:

    Não sei,mas acredito que não deveríamos adjetivar o Espiritismo,porque aí é que deveríamos demonstrar o que é o Espiritismo de verdade.Quando houver alguma interpretação equivocada,temos não podemos coadunar com tal prática.Se adjetivarmos a palavra Espiritismo,daqui ha alguns anos quantos espiritismos teríamos? Espiritismo Evangélico Kardecista,Espiritismo Filosófico Kardecista,Espiritismo Umbandista Kardecista,Espiritismo Kardecista x,y etc,a própria palavra Kardecista serviria p adjetivações! Será???Abraço e muita paz.

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  4. CE Vicente de Paulo disse:

    Republicou isso em .

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  5. Mario B disse:

    Quem se propõe a verdadeiramente estudar o espiritismo, acaba, mais cedo ou mais tarde, em algumas encruzilhadas, fruto de sua própria pobreza cultural, sendo a “adjetivação do termo Espiritismo” um verdadeiro clássico nesse aspecto. Não sendo oriundo da área das humanas, mas do mundo das ciências exatas, tive muita dificuldade com esse tema, embora sempre me ativesse à doutrina conforme estabelecida pelos espíritos superiores através do Mestre de Lyon. Após leitura dessa excelente e clara reflexão acima, agradeço muitíssimo porque passo a contar com um embasamento mais racional na defesa do Espiritismo Kardecista, tão maltratado, mutilado e adulterado desde o dia seguinte à morte de Kardec.

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