O centro espírita é um espaço democrático?

mattbooker-electiondrawings-itsnicethat-1Em uma busca rápida pela internet vê-se que centro espírita possui várias definições e funcionalidades: escola da alma, pronto-socorro ou hospital espiritual, lugar onde se faz caridade ou assistência social, oficina de trabalho, associação, entidade filantrópica, etc, e todas elas, de certa forma, reproduzem a realidade.

No centro espírita, ocorrem ou podem ocorrer várias atividades: estudo e divulgação da doutrina com crianças, jovens e adultos, entrevistas, passes, reuniões e estudos sobre mediunidade e assistência social, que se desdobra desde distribuição de cestas básicas a formação de caravanas para coleta de alimentos, até oferecimento de cursos profissionalizantes e visitas a hospitais, asilos e abrigos, ou ainda fundação e manutenção destes.

Democracia vem do grego: demo – povo e cracia – governo, ou seja, governo do povo. Basicamente, é um sistema onde todos são convidados a participar das decisões, seja através de eleições e plebiscitos, seja através da liberdade de expressão e da manifestação da opinião pessoal ou coletiva.

A maioria dos centros possui eleições para a diretoria, mas em que medida isso reflete a democracia?

É muito comum existir nos salões das casas espíritas uma placa onde se lê “O silêncio é uma prece” que visa desencorajar a conversa, o contato. Várias atividades são interditadas a crianças, jovens e recém chegados, como a abertura e encerramento dos trabalhos, o comentário de salão, as reuniões mediúnicas, a aplicação de passes e de aulas, as quais ficam reservadas aos frequentadores mais antigos, adultos, que já frequentaram outros cursos e treinamentos, havendo pouca ou nenhuma mobilidade entre elas.

Via de regra, as casas são divididas em departamentos e não há comunicação entre eles. Muitas vezes, os voluntários de uma área sequer conhecem os outros.

Os temas do “evangelho” de salão, das aulas e dos cursos são escolhidos pelos dirigentes da casa ou pelo expositor, ignorando a demanda daqueles que chegam, suas necessidades e interesses, bem como das comunidades onde estão inseridas.

Temas atuais mais desafiadores como a questão de gênero, o machismo e o feminismo, o racismo, o direito dos animais, a desigualdade social e o aborto como questão de saúde da mulher e respeito ao direito individual, raramente são levantados.

Não é incomum uma pessoa questionadora ser afastada das aulas e das decisões e ser encaminhada a tratamento espiritual, tornando dogmas determinados assuntos. Também não é incomum que algumas destas pessoas se afastem definitivamente da doutrina espírita.

Num tempo em que há escolas sem muros, escolas nas florestas, escolas democráticas, em que se busca a autonomia da criança e o empoderamento das populações historicamente maltratadas, é preciso perguntar se este modelo de centro corresponde aos anseios de um mundo novo, centrado no ser humano/espírito eterno ou, simplesmente, em função de que ele existe.

Cláudia R Azevedo

 

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18 respostas para O centro espírita é um espaço democrático?

  1. DANIEL MONTEIRO disse:

    Excelente texto para reflexão, de saber se é esse o modelo de centro que queremos

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  2. Sandro Rodrigues disse:

    Cara Cláudia, muito boa sua reflexão! Concordamos que o Centro deva ser um espaço de crescimento espiritual democrático, onde o diálogo seja o método! Preponderância de visões tacanhas e fossilizadas atrapalham a ética da generosidade e do respeito entre os trabalhadores! Vamos juntos criar uma nova dinâmica de Centros Espíritas no Brasil e no mundo!

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  3. Claudio Palermo disse:

    Parabens! sem falar das entidades federativas rsrsrs

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  4. A autora está de parabéns! Posso compartilhar em minha página? É necessário levar esta questão à pauta das reuniões nas Casas Espiritas.

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  5. Parece que você não conhece bem a Doutrina Espírita e muito menos os livros (sérios) que temos. Claro que no espiritismo temos muitas bobagens, mas na regra geral Allan Kardec colocou que o papel do espírita é ser hoje melhor que ontem, amanhã melhor que hoje ou seja evoluir sempre, mas estamos tratando de seres humanos com limitações, e que a edução desde a primeira idade reflete em que somos, cabe a cada espirita melhorar a si mesmo e ajudar a sociedade mas antes de tudo conhecer a si mesmo e transformar-se, é disso que trata a doutrina espírita, qualquer problema é do ser humano e não da doutrina, assim como qualquer religião.

    Luciano Quatrochi

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  6. Marcio disse:

    Vejo que levantas um assunto pra lá de serio. Que democracia? E possível ver que lá dentro repete-se a mesma forma de governo daqui de fora: alguns escolhidos se reúnem e decidem sozinhos o que o restante deverá fazer. Criticar ou questionar algo? Deus me livre: “…estas com obsessor e deveras fazer um tratamento..”. Por falar em obsessor, está figurinha tem mais direitos garantidos que os mentores, ou amigos espirituais. Veja so: o obsessor vem fala, fala…alguém questiona? Não! “Coitado…merece nosso respeito”. O mentor ou amigo espiritual vem: fala algo simples pra nossa realidade: “…todos questionam: “…visse a encorporação? …isso é das trevas, quer nos enganar”. Resumindo: mas vale ser mentor, se fazer passar por obsessor e dar seu recado: assim será aceito sem oposição.
    Sem contar os rituais que aos poucos começam a se manifestar. Para terminar: democracia?

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  7. Preconceituoso . Todos os locais onde se busca a interiorização, a reflexão, o contato com o Eu interir necessita de silêncio. Em qualquer prática religiosa é assim, salvo nas neopentecostais, com seus gritos. Acho que esse texto só reforça as teses dos críticos da doutrina espírita.

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    • Dora Incontri disse:

      Centro espírita não é um templo religioso. Para Kardec, era um local de estudos, já que ele chamou a Sociedade que fundou de Sociedade de Estudos Espíritas. E onde há estudos, há debate, questionamentos, conversa. A prece precisa de silêncio, sim! Mas nem todo silêncio é uma prece, pois onde a mente está conturbada, os lábios podem calar, mas os pensamentos podem gritar.

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    • Marcio disse:

      Pra mim preconceito e não ter a capacidade sublime de ouvir o outro e de forma intransigente não aceitar seu ponto de vista. Daí vaum num templo buscar o eu e no contato diário se manifestam iguais lobos.

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  8. Joana Abranches disse:

    Na pleura, Claudia Azevedo!!!… que democracia que nada… dogmatismo, autoritarismo, igrejismo e farisaísmo, é o que tem campeado nos grupos espíritas e no movimento como um todo.

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  9. Para a maioria das casas, a gestão é muito simples e superficial. Fico até surpreso que dá certo, embora o dá certo queira dizer consigam empatar as despesas com as receitas. Qualquer pessoa pode assumir a direção, mas ela deve se esforçar para conhecer e aplicar o mínimo necessário para uma boa gestão, como ouvir todos os envolvidos e ter indicadores. Incrível com as casas desconhecem a evolução e a tendência das suas principais atividade, não sabem se a evasão dos cursos está aumentando ou reduzindo, se os novos frequentadores continuam ou desistem da casa e até mesmo se as receitas de cada fonte estão se comportando. Acreditam a espiritualidade vai garantir os resultados e a continuidade dos serviços. Não pesquisam a opinião dos trabalhadores, não abrem canais para receber críticas e sugestões e, principalmente, não desenvolvem o senso crítico e participativo dos colaboradores que devem apenas servir humildemente. Influência do religiosismo exagerado?

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  10. Edmar Galves disse:

    Claudia, acredita que ontem tivemos uma reunião de planejamento da USE Tucuruvi e que conversamos sobre isso?
    Parabéns pelo texto.
    Você tocou em assuntos que estão na superfície e surgem como demandas.
    Cabe-nos aprofundar no conhecimento das causas e soluções mergulhando na sabedoria de Kardec.

    E o silêncio… quase nunca é uma prece.

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  11. Euler disse:

    Sobre a democracia nos centros Espíritas, cabe uma reflexão:
    Se é um espaço onde se faz a transmissão dá Codificação, se existe a necessidade de um preparo para os passes e se as palestras são sobre assuntos pertinentes a codificação e obras Espíritas sendo um momento oportuno de o expositor manifestar suas opiniões sobre o tema com base nas obras Espíritas.
    Se mesmo sob balizamento da Codificação e obras espíritas, existe espaço para discussão e debates. Porém, qualquer assunto sobre temas atuais devem ser tratados sob a ótica dos espiritismo. Pois de outra forma estaríamos produzido uma outra coisa que não é própria dá Doutrina Espírita.
    É altamente aceitável o debate, as opiniões, a participação. Porém é indiscutível a necessidade destas manifestações com o devido preparo e orientação. Todos movimentos no sentido de ser participativo, uma ciência, uma construção de conhecimento, uma divulgação doutrinária, enfim qualquer forma de comunicação ou estudos sobre qualquer assunto requererem um fórum onde surgem e se manifestam determinadas demandas. Ao que me parece estes fóruns se dão ou deveriam se dar em ambiente com participação de membros que estudam o tema.
    Ora, se o Espiritismo é uma Doutrina, os estudos são oferecidos indistintamente a qualquer interessado, as casas espíritas tem suas diretrizes, orientações e filiações e associações livres e democraticamente escolhidas. Neste sentido não vejo despotismo ou qualquer outra prática anti democrática.
    Entretanto, vivemos numa sociedade elitista. Neste sentido, percebo não apenas os centros espíritas mas todas as formas de organização sociais como uma representação desta forma de organização social.

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  12. Marcelio Santos disse:

    Herculano Pires já chamava a atenção para a formação dos Centros espíritas, dizendo que, por serem formados por pessoas que, na sua grande maioria, advinham de outras regiões, sobretudo o catolicismo, troxeram toda uma bagagem de ranços e atavismos cristalizados e o pior é que não se despiram deste e acabaram implementando-os no centro como parte da Doutrina, o que não é. Com isso, temos hoje muitos centros espíritas adotando práticas absolutamente sem nenhum vínculo com a causa espírita, muito pelo contrário, práticas que, ao invés de libertar, aprisionam, inclusive eles próprios.
    Diz-nos ainda Herculano Pires que o dia que os espíritas souberem, cientificarem da função primordial do Centro Espírita, o espiritismo será o maior movimento cultural do mundo.

    Até lá, sigamos lutando por um centro cada vez mais democrático e libertador de consciências.

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  13. GIlson Alves de Lima disse:

    Prezada Dora. Certa feita em animada troca de ideias com o Dr. Jorge Andréa. Ele me dizia que 95% dos espíritas não sabem o que é o Espiritismo. Longe de ser uma religião no modelo tradicional é um instrumento de regeneração humana pela educação. A questão 798 do LE. Mostra claramente que essas discussões sobre opiniões pessoais nos centros espíritas são priorizadas em detrimento do estudo, das pesquisas e da criação de projetos culturais que enfatizem o conhecimento espírita e principalmente sua divulgação. Em nossa casa criamos um projeto cultural em parceria com a FMIT e a UNIFEI. Para discussão do Tema Ciência e Espiritualidade no meio acadêmico. Parece fácil mas a concretizacao desse projeto levou 20 anos de discussao. Mas se faz absolutamente necessária uma reavaliação da nossa postura diante de uma doutrina que quanto mais o tempo passa ela mais se concretiza em seus objetivos pela sua racionalidade cultural, contudo. Apesar dos homens!

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  14. Aleksandro disse:

    Separar crianças por tarefa, pedir o silêncio em determinadas áreas não é ser antidemocrático. Toda democracia possui regras. Sou dirigente espírita. A casa desenvolve cursos, e as palestras são discutidas com os conselheiros. Todo o sistema da casa é discutido em reuniões para que todos sejam ativos. Mas como você mesmo disse no início, a casa espírita é um pronto socorro, e as pessoas não ficam, já que só vem se curar. Não aprendem que a continuidade indica saúde espiritual.
    Pra finalizar, a casa abre as eleições para a diretoria e conselho, e normalmente temos que o ficar alguém, já que ninguém quer ter uma obrigação ou compromisso gratuito. Por isso muita entidade religiosa prega o dízimo, para o custeio de trabalho.

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